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Opinião | O Conde de Monte Cristo de Alexandre Dumas

"Toda a sabedoria humana se resume nestas palavras:

                                                            Aguardar e ter Esperança!"


     Review in english     



O jornal "Journal des Débats" publicou a obra de Alexandre Dumas sob a forma de periódico, publicando as 18 segmentos em agosto de 1844 e terminando em janeiro de 1846. Chegou a ser o livro mais popular da Europa. 

Dumas baseou-se na história real de Pierre Picaud, um sapateiro acusado de traição, incriminado por 3 amigos que cobiçavam a sua noiva rica. Conta-se que Picaud começou a servir um clérigo italiano e que, quando este faleceu, deixou a sua fortuna a Picaud. Quando Picaud estava no seu leito de morte, persuadiu com uma pequena fortuna, um amigo, Allut, a contar quem o tinha traído. Fingindo a sua morte, vingou-se de todos o que traíram deixando quem casou com sua noiva para último, assim como o pior castigo. Após a vingança, Picaud foi morto pelo seu amigo Allut.

As referências bonapartistas, nomeadamente a caracterização de algumas personagens, é baseado no pai do autor, que foi um general sob o comando de Napoleão.




Como já devem ter ouvido falar, o livro fala de Edmond Dantès, incriminado de ser portador de uma carta que revela uma conspiração bonapartista, ou seja, de traição - aquela que leva aos famosos 100 dias que Napoleão, saindo de exílio, tomou o trono a Luís XVIII.
Dantès, após a sua fuga da prisão, vinga-se daqueles que o incriminaram, com os tesouros que o prisioneiro número 27, Abade Faria, lhe passa.


"Aprender não é saber. Existem os eruditos e os sábios, a memória faz os primeiros, e a filosofia, os segundos. (...) A filosofia não pode ser ensinada, é a reunião das ciências adquiridas ao génio que as aplica."


Por ter lugar entre 1815 e 1844 vemos imensas referências ao exílio de Napoleão e o seu regresso em março de 1815. Dumas escreveu juntamente com Auguste Maquet que juntava personagens e o enredo enquanto Dumas escrevia os diálogos e detalhes colocando a sua magia em papel. Também era Maquet que verificava todas as referências históricas para que o enredo fosse preciso. Por exemplo, Ali Paxá de Tepelene, sua cônjuge e o seu assassinato são reais, apenas Haydée é que não (infelizmente!).

Factos e afins à parte... Quantas vezes me ouviram a falar do Conde?

Imensas. Várias. Demasiadas.

Não, nunca demasiadas.

Este é O livro.

Este livro não é sobre vingança. É sobre dor, é sobre perdão e é sobre esperança.

Contado na terceira pessoa e através de uma linha temporal extensa, mas sempre no presente, somos espectadores de uma história que nos deixa colados do princípio ao fim. 

Dumas adopta uma escrita leve, intuitiva e romantizada, com imenso drama típico de novela, e com partes cómicas (nomeadamente a entrevista do Conde com o Major Cavalcanti). O livro pode ser intimidativo pelo volume, mas uma vez que entramos na história, não damos pelo tempo passar.

Como Dumas publicava sob a forma de periódico, como já foi mencionado, recebia à linha, daí vermos imensos diálogos e alguns partes mais longas.

Testemunhar a mestria do plano de Dantès é absolutamente fascinante e coloca qualquer escritor de thrillers e de dramas psicológicos a um canto com a criatividade apresentada. Dantès, movido pelo sentimento religioso, refere que age sob um instrumento da Providência, utilizando como justificação dos seus atos.

Assistimos ao longo caminho da transformação de Dantès, desde o miúdo ingénuo a vingador implacável a tentar encontrar redenção perante a possível redescoberta de emoções humanas.

Para levar a cabo o seu plano de vingança, Dantès adopta várias identidades inventadas, uma delas Abade Busoni, um padre italiano. Desde modo, durante os 10 anos desde que ficou livre da prisão até o início do seu plano (encontro em Roma com um dos personagens), estudou tudo o que seria possível descobrir sobre cada um intervenientes da desgraça que caiu sobre si, e arquitectou o plano precavendo todos os contingentes. Levou a cabo todo o plano com uma manipulação inacreditável, fazendo inveja ao próprio Satanás.

As principais questões que se elevam neste livro são a justiça e a esperança. 

Qual a diferença entre justiça e vingança? 
Até que ponto uma vingança será justa? 


Nunca. 


Não somos mais que aqueles que habitam connosco. 


A nossa decisão não cabe nas decisões do outro, mas sim em nós. 
A justiça cabe ao sistema a quem de direito, e a vingança em lado nenhum. Seguir para o lado da luz em vez de seguir para o lado mais negro, para a escuridão, leva tempo e realizações que pensávamos que nunca iríamos ter. E é aí que cabe a esperança. 
A esperança que a felicidade prevalecerá àquilo que sofremos.

Os pensamentos modernistas que estão presentes no livro, criados por mentes que na altura viviam numa cultura ainda bastante conservadora, no século XIX, ainda são falados hoje em dia, em pleno século XXI. 

Feminismo, maternidade, justiça, escravidão, racismo, homossexualidade, valores que um jornalista deve ter em consideração, hierarquia social, o valor de um perdão, corrupção.


Estamos a falar de dois escritores do século XIX a falar da aceitação da  homossexualidade. 

Estamos a falar de dois escritores do século XIX que empoderam a mulher e o seu direito à liberdade, em todos os sentidos.


Acabamos este livro com uma sensação de paz interior, de tão bem que Dumas transmite os sentimentos humanos, e a capacidade do Homem de estar acima das adversidades, por mais duras que sejam. 
Haverá sempre alguma coisa que traga clareza ao leitor, pela forma que se pode aplicar estas lições na própria vida, nos próprios erros.





O Conde de Monte Cristo IO Conde de Monte Cristo I de Alexandre Dumas

Classificação: 5 de 5 estrelas







O Conde de Monte Cristo IIO Conde de Monte Cristo II de Alexandre Dumas

Classificação: 5 de 5 estrelas


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